quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Bom-dia

Maldito seja, pesadelo doente
Que em meu merecido descanso irrompe,
Espancando-me ao peito, alucinando-me os músculos
Matando tudo dentro de mim.

Me derrama ondas de dores e desesperos,
Que me apavoram e me esgotam.
Meu corpo sucumbe.

Minhas pálpebras covardes garantem a incerteza da escuridão
Meu corpo moribundo tenta perceber a realidade
Gélido diante da ameaça da realidade ser o irreal

Descubro-me, pois, emaranhado em seu corpo macio e quente,
Nariz enterrado em suas mexas cheirosas,
Boca em um beijo eterno em seu pescoço umedecido.

Meus braços envolvidos com os seus em um abraço memorável
Nossas pernas entrelaçadas – alianças da nossa presença.
Suas costas esguias aconchegadas em meu peito
Compassam meu coração com sua respiração tranqüila.

Trago-te mais a mim,
Minha angústia alivia,
Meu corpo se entrega,
Minha mente desliga.

Choro meus medos
Esqueço a fatalidade
Brindo à realidade.

Você se aconchega,
Aperta meus braços,
Pede meu beijo.

Beijo-te, anjo do meu coração,
Com todo ímpeto de quem foi salvo
Direto das trevas para seus lábios açucarados.

Sinto seu cheiro, sua pele macia,
Seu amor flamejante, seu corpo inquieto:
“Bom-dia!”.

sábado, 23 de agosto de 2008

De Santa Gertrudes para o Mundo...

Pessoal, é com muita satisfação que comunico-lhes que o "Desce Mais Uma!" está exportando material! Agora, além de contarmos com ilustres visitantes Lusitanos, estamos invadindo a Itália.
Logo teremos vinhos em nosso cardápio e poderemos dizer: "Scendi Più Una!"

Confiram no blog de Franco Lofrano e no blog Marina Jonica de Francesco D'Amore.

Abraços e bom fim de semana,

Rafael

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Era uma vez uma Novidade

Ah, como é delicioso o sabor de uma novidade! Aquela novidade de algo surpreendente introduzido em nossas vidas e que nos rouba toda a atenção. Que nos faz dedicarmo-nos de maneiras improváveis e questionáveis. Que derruba valores, conceitos e definições. Que nos faz agir como inconseqüentes, passando por cima de tudo, de todos e até de nós mesmos, apenas para estarmos próximos. Que nos tira a concentração de todo um dia. Que não sai dos pensamentos, ou melhor, que é nossos pensamentos, e exige nossas presenças, ações e olhares. Como é bom viver a novidade, carregá-la no bolso do paletó, para cima e para baixo, exibindo-a a todos, com orgulho e arrogância. Aquela novidade que nos faz rever todos nossos conceitos, nossas atitudes, nossos sentimentos, nossos objetivos, nós mesmos.

Novidades assim nos fazem mudar, construir, destruir e, inclusive, nos enganar, simplesmente para tê-las plenamente em nossas entranhas. Dão-nos razão para um despertar alegre, para um dia entusiasmado, para um adormecer pueril. Fazem com que nossos corações batam empolgados, com que tenhamos o corpo inquieto por sentimentos intensos, com que as rédeas da razão sejam soltas para que possamos sentir o vento tocando nossos rostos enquanto somos tomados por uma sensação de paz em um galope sem destino, em uma praia qualquer, de braços abertos e peitos cheios.

Ah, melhor ainda é ser novidade! Ser desejado, ser perseguido, ser cobrado pela ausência, ser quisto no amanhecer, durante o dia, no tarde da noite. Ser pensamento de quem busca inutilmente o sono. Ser mantido no coração, ser fonte se sonhos de uma vida, ser motivo de felicidade buscada, ser alvo de destino manipulado, ser tido como o escolhido que nunca foi achado. Como é bom ser especial, ser buscado, ser cuidado, ser porto-seguro, ser afago, receber sorrisos de bom-dia.


É, mas a vida tem um senso de humor doente. Brinca conosco de forma cruel: sem que ao menos percebamos, transforma a novidade em algo comum. Aquela novidade se transforma em algo corriqueiro que não merece mais tanta atenção, dedicação e, nem ao menos, desperta aquela inquietude que tanto nos motivara. Desvaloriza-se e perde a prioridade em nossas vidas. Sai do bolso e vai para a estante, onde será vista vez ou outra quando passarmos sem pressa e, talvez, vez ou outra, trará aos nossos pensamentos algumas lembranças ternas do tempo em que ainda era novidade, mas sem aquela intensidade com que foi concebida. Na estante, faz parte da nossa paisagem, estará sempre lá e acreditamos que isso é suficiente. Que nada necessita ser feito, pois, se preciso for, basta apenas esticar os braços para ter a antiga novidade – novo algo comum.
Dizem que é assim que caminham as vidas. Que assim são as coisas. Mas não posso admitir isso, não posso admitir a estante. Não posso admitir que tenhamos o direito de tornar comum algo que nos faz incomum. Deixar de lado, sem mais nem menos apenas acreditando que está intrínseco e dispensa afagos. Uma planta que não é regada cuidadosamente todos os dias não nos mostra suas flores; ela seca!

Quero descobrir como se faz para passar por entre os acontecimentos rotineiros, os problemas, as prioridades, as dificuldades e sair do outro lado ainda como uma novidade. Mesmo não sendo uma novidade nova, mas que ainda seja novidade, eterna. Quero aprender como regar minhas plantas todos os dias para que, ao invés de secarem, continuem a florir minha vida.

Não quero ser paisagem, me nego a terminar em uma estante, empoeirado.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Moleque de Rua

Lá vai ele: menino moleque!
Vai feito barata às janelas dos carros
Que se fecham em desespero à sua presença.

Menino fedido, que de nariz escorrendo à boca
Lambuza as portas dos carros com suas mãos imundas.
Embaça os vidros dos carros com seu hálito malicioso.

Arrasta os pés encardidos, com dedos rachados e unhas gastas
Que tentam se esconder no que resta do chinelo de tira estourada.

Sua mão é ligeira aos olhos cuidadosos.
Sua língua é afiada aos ouvidos misericordiosos.
Sua face é tirana aos corações piedosos.

Leva essas moedas que não são suas.
Míseros centavos que nunca justificam sua existência
E ao menos compram seu veneno.

Deita moleque menino,
Estira ao relento esse corpo usado,
Talvez amanhã alguém lhe note,
Se o caminho atrapalhar.

Não se preocupe, menino sem nome,
Os jornais nada dirão,
Os números não mudarão,
Você nunca foi estatística.

Descansa menino imprestável,
Como você, outros virão,
Sua falta nunca será sentida,
Mas talvez de seus centavos.

Voa anjo pagão!
Seus pecados já foram pagos
Por todas suas vidas.
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Anche in Italiano nello Blog di Franco Lofrano