terça-feira, 28 de junho de 2011

O Tesouro do Capitão Perdido

Depois de todos os mares três vezes atravessar,
De uma sorte de temíveis monstros marinhos enfrentar,
De uma rústica tripulação esbravejante comandar,
Por entre tribos, não mais primitivas, mas ansiosas a lhe comerem o fígado e saborearem o cérebro, sobreviver,
O nobre capitão, por fim, encontrou-se e orgulhoso sorriu ao avistar, entre névoas, as praias de um dos seus tão procurados destinos.

Nem bem atracou, lançou-se entusiasmado ao caminho gravado em sua mente, um dia revelado pelo mapa em seu bolso.
Em instantes parou súbito à praia, agradecido olhou desconfiado aos céus.
Sem as intituladas roupas pesadas, cavou o mais fundo e mais rápido que pôde até encontrar o que tanto procurou.

De dentro do antigo baú, enrolado em trapos velhos, retirou seu tão sonhado e desejado tesouro.
Radiante, pôs-se menino a contemplá-lo, enquanto se deleitava com a estranha sensação da pura felicidade da completude transbordando de seu coração.

E assim o fez durante profundos e deleitosos instantes, suficientes para torná-lo comum à sua vida, da qual, por desleixo ao que é comum, permitiu que a maré o levasse, conforme tradição da sua espécie.

domingo, 19 de junho de 2011

Nas Entrelinhas

Não com um livro, mas com um lápis é que se compara a vida.

Capara-se a vida com um lápis a deslizar por entre as linhas, ora nas entrelinhas, em movimentos desconhecidos, outros premeditados, muitos outros até improvisados, que, ao se dar conta, formam significados, sentidos, verbetes.

Lápis que deixa por páginas, até tão brancas e vazias, rastros que eternizam memórias, momentos, sentimentos, muitos orgulhosos, outros esquecíveis, mas sempre perpetuados e denunciados, mesmo que pela rasura proposital.

E como lápis, desgasta-se! Passa a deixar marcas dúbias, borrões passíveis de correção [ah se houvesse uma borracha], até quando, novamente desbastado, toma-se forma nova e continua com traços delineados e firmes.

E em um gracioso movimento contínuo divinizado, segue adiante, ora com letras garrafais, outrora garranchos murmurantes; ora decorados e delicados, outrora minguados e entristecidos; ora precisos e centrado, outrora reticentes e trêmulos.

Mas sempre por novos parágrafos, por novas páginas, compondo um livro único, repleto de memórias e sentimentos, conquistas e derrotas, realizações e perdas. Um livro talvez nunca relido [quiçá lido], mas único e jamais extinguível!

Um livro escrito por um único lápis, que trilhou toda uma sorte meios e que por eles teve de passar sem fazer correções, talvez explicações, até seu desgaste pleno e a entrega ao derradeiro ponto-final, quem sabe seco e absoluto como um suspiro, ou talvez um contorcido rabisco de um espasmo agonizante, mas final.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Eterno Retorno

Quem é que diria, minguado amigo velho,
Você de novo neste buraco!

Não era você aquele que, às grandes perdas, aprendera as lições da vida?
Não era você aquele que, aos desastrosos erros, amadurecera a criança que habitara o seu peito?
Não era você aquele que, aos prantos e latências, soerguera-se e pusera-se firme a caminhar?
Não era você aquele que, por todos os seus fracassos e estragos, se postara astuto e infalível diante da vida?

Agora, como castigo pelo seu desleixo e arrogância, encontra-se aí,
Pendurado à beira do seu buraco sem fundo,
Agonizando indignado com mais este golpe.
Culpado só você é!

Pare com este lamentar tedioso,
Limpe este rosto suplicante,
E salve o que lhe resta de dignidade!

Vamos, deixe de bobagem e abaixe logo esta sua mão.
Use-a para a única coisa que agora lhe serve: salvar a si próprio;
Pois daí ninguém lhe tirará, nem mesmo eu.