segunda-feira, 25 de maio de 2009

Paraíso Meu

Quero todas as pedras no meu chão; nem pense em tirar uma sequer.
Quero a mata densa e selvagem; não me venham com veredas paradisíacas que terminam em suas planícies verdejantes.
Quero corredeiras turvas e violentas por entre quedas rebojantes; nada de seus córregos mansos e cristalinos.
Quero dunas nômades e escaldantes, famintas de mim; não me venham com estradinhas de chão batido por entre pastagens baixas.
Quero montanhas escorregadias, cobertas de rochas soltas, paredões; não quero um caminho sinuoso com corrimões do século passado.

Quero tropeçar em minhas pedras, quem sabe desviar de algumas outras.
Quero abrir minhas picadas mata adentro; por a mata a chão, construir minha planície.
Quero atravessar as corredeiras, aprender por onde nadar, onde escorar. Desviá-la e criar o meu riacho.
Quero vagar pelo meu deserto, duna a duna, até conhecê-las todas, por nome, e atenderem ao meu chamado.
Quero subir todas minhas montanhas, fazer rolar todas as rochas soltas, conhecer cada trinca do paredão, colocar minhas próprias estacas para a próxima subida.

E quando tiver medo, quando cair, quando me arrebentar,
Vou tomar um fôlego do tamanho do mundo, vou firmar minhas pernas, uma a uma, e vou me levantar, limpar meus joelhos ralados e continuar.
Não negarei as mãos que me estenderem, mas as ferramentas.

E quando o abismo vier, vou correr com toda minha força em sua direção,
Às gargalhadas, com olhar fixo, peito aberto, alma leve, sem olhar para trás
E vou saltá-lo em um vôo memorável, despejando sobre ele minhas derrotas e minhas dúvidas,
Deixando um rastro do meu mais puro sarcasmo!

E quando, entre meus tombos, me for negado o direito de continuar, poderei parar de respirar tomado pela incrível leveza de poder amar com toda a minha intensidade tudo o que conquistei em mim.
Não me lembrarei dos meus tombos, nem das minhas pedras, nem das minhas lágrimas – quiçá seus motivos.
Mas me lembrarei de como foi maravilhoso me levantar naquela manhã.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Aqueles Nossos Rostos

Eis que não a última, nem a primeira composição para bruscamente em frente ao rebanho a se recolher, apartado em amontoados tentando a qualquer custo se alinhar às bruscas porteiras que se abrem e fecham aos solavancos.

Condicionados, ao abrir, estouram seringa adentro esbarrando-se em busca do lugar menos desconfortável, ou talvez mais cômodo, agitados pela irritante campainha que lhes cutuca os tímpanos.

Corpos cansados escorados uns aos outros, amassados, sujos e surrados das mais diversas lidas, das mais distantes pastagens – difíceis até de imaginar.

Rostos! Ah, rostos!

Das mais variadas raças, formas e idades, com as mais diversas expressões e olhares.
Desconhecidos, e talvez nunca revistos, que revelam histórias inimagináveis, questionáveis, condenáveis, lamentáveis, irrepetíveis, incontáveis.

Tem-se de tudo, de todos, para todos: tristeza, perda, traição, fracasso, dúvida, insatisfação, solidão, decepção, abandono, desistência, vontade, saudade, desejo, angústia, desilusão, revolta, indignação, desconsideração, humilhação, desprezo, ignorância, arrogância, asco, irritação e tantos outros que só acontecem àqueles, naqueles.

Ou será tudo apenas cansaço? Quem sabe ânsia do chegar?

Não sei, não se sabe, não se deve, nem se é! Quem são? Muito prazer!

E entre tantos, aos balanços, um me foi revelado, do outro lado, olhando para mim, para dentro de mim, fixo e espantado, como eu.
Da mesma espécie, de outra raça, ou de todas, ou nenhuma, mas não estranho.
É aquele que me acompanha, aquele que não conheço, que não compreendo, que não me atentei, que perdi e que agora se alimenta daquilo que de nós e a nós se revela desse nosso tudo.
Prazer em rever-nos! Seja bem-vindo!

terça-feira, 12 de maio de 2009

Mais uma homenagem do Aloizio: "Castellar"

Mais uma vez o amigo Aloizio Santos me alegra com uma bela homenagem! Obrigado e um grande abraço, Aloizio!

Vou encastelar meus sonhos,
Um jardim vou colocar
Em volta porei um fosso
Inimigos não vão entrar.

Castelo e não de cartas
Para nunca mais cair
Sonhos de cinderela
Meninas terão aqui.

Vou enfeitá-lo de rosas
Mas que sejam sem espinhos
Assim chamara atenção
De que vem pelos caminhos.

Vou cobrir de ouro e prata
Diamantes vou colar
Para refletir o brilho
Nos olhos de quem o olhar.

Vou encastelar meus sonhos
No reino da imaginação
Realidade alternativa...
Sonho grande, sonho bom!

terça-feira, 5 de maio de 2009

Sem Sentidos

Em meus infindáveis pensamentos me pergunto como enganar esse maldito retorno.
Já é um tanto óbvia a minha incapacidade frente ao meu obscuro eu.
Desculpas mil, efetivos apenas o tempo e as feridas.

Só me resta deixar de alimentar o que existe lá dentro.
Aquilo que me dita as regras, os atos, os sentimentos. Sufocá-lo de si.

Um arame fino e maleável seria suficiente para furar permanentemente meus tímpanos. Assim não seria mais preciso ouvir votos falsificados, promessas abortadas desde a concepção, palavras incapazes de serem sustentadas em pleno presente, que apenas me arrastam encantado para o tão próximo nada inatingível.

Com uma faca de pão conseguiria destroçar toda minha cartilagem nasal e ainda danar todo interior dessa fossa. Assim não mais sentiria o perfume lascivo que me vira a cabeça e me condena o corpo, o aroma dos pecados tão desejados que me saciam a alma, a podridão das mentiras inconsequentes tão desconsideravelmente escarradas em meu rosto.

Uma linha reforçada, conduzida por uma fina e pontiaguda agulha, costuraria definitivamente meus lábios um ao outro. Assim não mais propagaria meus malditos sentimentos, não semearia meus doentios pensamentos, nem disseminaria meus tão questionáveis e indesejados desejos – que têm como única função serem armas contra mim mesmo –, e, ainda, não mais saborearia um só pedaço daquilo que só me é oferecido para que possa ser mais prazerosamente negado.

Poderia ainda cravar uma colher abaixo das minhas pálpebras e arrancar das órbitas, com um só firme golpe, meus já tão cansados e insatisfeitos olhos. Assim não mais seria preciso ver aquilo que me tenta, aquilo que me escondem, aquilo que me negam e nem aquilo que causo.

Um machado de cunha bem afiada seria ideal para o fim. Erguendo-o de todo o comprimento de nossos braços, em um único movimento, poderia separar de mim a mão inimiga, para que não mais sentisse a maciez apaziguante, os movimentos tranqüilizantes, a textura proibida e desejada, e nem mais quebrasse tudo aquilo que toco na ânsia de trazer para dentro de mim.

Então, só me restaria ao amigo suplicar o último e mais importante dos favores: que suspendesse o cabo pela ponta o mais alto que pudesse e trouxesse o fio abaixo com toda sua força passando despercebidamente pelo pulso derradeiro, livrando-me da mão traidora – a única que poderia me negar toda esta libertação.