segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Penitência - 1/3

Um conto em três partes, espero que gostem. Na semana que vem, a parte 2.

*          *          *

Já faz algum tempo que estou entrevado nesta maca. É maca sim, cama de hospital não passa de uma maca. Não tem posição que alivie as dores nas costas ou que me dê um pouco de conforto na paciência. Na verdade não faz algum tempo, faz tempo pra caralho! Tanto tempo que nem sei dizer.

Entra dia, sai noite e eu continuo aqui, na mesma situação. Esperando sei lá o quê. Um problema no estômago me jogou aqui, era pra ser temporário, mas sabe como é, a idade ajuda a pesar o corpo e uma coisa leva a outra, um problema some, dois aparecem e por aí vai, estou todo fodido. São tantas coisas que eu passo a ter e deixo de ter que nem sei mais qual é o meu problema atual. Os médicos já não falam mais o pouco que falavam. Se dirigem a mim como se eu fosse um cachorro velho. Vêm, mexem, fuçam, cutucam, viram, apertam, enfiam, espiam, bocejam, anotam e se vão, sem dizer nada. Não me cumprimentam, não me explicam, no máximo um sorrisinho e um tapinha na perna doente. Ou já sarou? Ah, sei lá, não lembro e não importa, tudo dói mesmo. Sei que eles fazem assim comigo, acho que já se acostumaram comigo aqui como se eu fosse parte desta decoração de mau gosto. Eita, povinho pra ter mau gosto! Também não me importo mais em perguntar. Cansei de implorar para conseguir alguma resposta deles. E quando eles resolviam dizer alguma coisa, falavam comigo como se eu fosse um médico. Não entendo merda nenhuma do que eles falam. Então a coisa vai ficando assim: eles vêm, não falam, eu não pergunto e tudo fica bem. Bom, bem para eles que podem ir embora e ter a vidinha deles...

Com os enfermeiros a coisa não é diferente. Só um rapaz baixinho, meio esquisito, que ainda conversa um pouco comigo, às vezes até chega animado com sorriso no rosto e faz alguma piada sem graça, mas que é de boa vontade então eu forço um riso amarelo. Outras vezes ele aproveita e fica um tempo aqui, não comigo, fica no celular dele falando com não sei quem, mas já é uma distração pra mim, sabe? Não pergunto nada sobre a ligação e ele também não diz nada. Fico como se não estivesse ouvindo, mas estou e me divirto um bocado, confesso. Os outros enfermeiros são uns imbecis. Além de não falarem comigo, como os médicos, são grossos e estúpidos na lida. Dão um banho sem-vergonha a cada dois dias, trocam os lençóis uma vez por semana, demoram a trocar meu papagaio, não respondem quando chamo ou quando berro. Quando não consigo segurar, me cago todo na cama, que situação! Demoram pra trazer aquela porcaria de comida e sou obrigado a engoli-la fria, é uma droga. Me regaçam todo, vão embora, não perguntam nem se dói alguma coisa ou se preciso de alguma outra. Meus braços parecem peneiras, estão todos roxos, todos cheios de feridas, pareço um viciado. Esses filhos da puta não conseguem acertar uma merda veia? Só fazem isso, porra!

Ainda tem o meu colega de quarto. Na verdade já se passaram vários por aqui, mas para mim são todos iguais: gemem, vomitam, fedem, reclamam, se curam e se vão. Procuro não conversar muito e nem dar muita atenção. Alguns ficam aqui jogados também, outros têm família que os vem visitar, mas não me importo. Como sempre tem um, então trato como meu colega de quarto e pronto.

Teve um que passou muito mal numa madrugada dessas. Sorte que eu estava meio acordado e fiz um escândalo aqui até aparecer alguém para acudir. Ele não podia falar, não lembro porque, acho que era porque tinha uns tubos enfiados na goela. Mas acho que ele ia bater as botas se eu estivesse dormindo. O pobre infeliz começou a se debater, espumar, virar as bolas dos olhos, tremer, se contorcer... Uma coisa bem feia de se ver... Mas no fim foi embora, então deve ter ficado bem.

Confiram também: Parte II - Parte III

24 comentários:

  1. Caramba Rafa, seria isso um hospital mesmo?? Pior que esses existem neh. To até com medo de ver o fim desse conto! Ai meu Deus!! Entre uma frase ou outra me lembrei dos mêses de dezembro/2012 a janeiro/2013, o tratamento foi bem melhor mas sei lá, pra quem fica naquela cama (maca) sendo furado o tempo todo...acho que tem tudo a ver.
    Bem já começo a estar curiosa pra ver o desfecho dessa história, mas vamos lá, semana que vem chega logo.
    Beijocas
    Cris.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Tia!! É um hospital sim, mas não esse que vc está pensando...fique tranquila, neste caso a situação é bem diferente e esta é uma ideia de quase um ano atrás que estava na minha lista... O cara do nosso conto está bem no fim e sozinho há muito tempo...

      hahahah....tomara que goste tia!

      beijos!!

      Excluir
  2. MEU DEUS!QUE SITUAÇÃO!!
    Quero ver os outros 2/3...

    Abração
    Jan

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Jan!! Que legal, espero que goste do resto! Próxima segunda vem a segunda parte...

      []ss

      Excluir
  3. Rafael:

    Que dureza de rotina hein...rs

    Gostando do conto.

    Abraços querido.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Grande Edilson!

      É...não deve ser nada fácil mesmo...que bom que está gostando, espero que goste do resto tbm...

      []ss

      Excluir
  4. Oi Rafael, passando para conhecer seu canto e agradecer pela visita. Adorei tudo por aqui, já estou seguindo.
    Bjo no coração.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Mara!! Seja bem-vinda! Que bom que gostou e que vai ficar por aqui....muito obrigado!

      Beijos

      Excluir
  5. Nossa Rafael!

    Por que faz tanto tempo que ele tá preso no hospital? E ele não tem parentes? Fiquei aflita com a situação dele, que é até melhor do que a de muitos cidadãos brasileiros, que morrem sem assistência médica. Mas mesmo assim fiquei bem aflita.
    O que só prova que vc escreve bem, não é? rs

    P.S: Se quiser segue meu blog, te sigo de volta

    www.reticenciando.com

    Milhões de beijos

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Julliana!! Também não sei, viu? Acho que nem ele...rsrsr...

      Fico contente que tenha tido esta reação ao ler esta parte, era realmente o que queria causar...e muito obrigado pelo elogio...estou tentando...rsrrs

      Pode deixar que vou passar por lá...eu sigo via RSS

      Beijos

      Excluir
  6. Que situação! Bah! Porém, estou gostando. Tu és criativos. Acompanharei os próximos capítulos deste conto. Gostaria de escrever contos, também. Porém, ainda não consegui ou não me esforcei tanto. Beijinhos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Aline!! Que bom que está gostando...fico contente....acompanhe sim, na próxima segunda virá a segunda parte....

      Também não tenho escrito muitos contos. Na verdade classifiquei alguns como contos por não entendê-los como poesias... O primeiro que realmente reconhceço como conto foi Em Uma Encruzilhada Dessas . Também tenho tentado, mas preciso esforçar mais..rsrsr

      beijos..

      Excluir
  7. vá agora estou em pulgas pelas outras duas partes
    até lá...

    ResponderExcluir
  8. Oi Rafael, retribuindo a sua visita ao meu blog... Adorei tudo. E fiquei curiosa pelas outras duas partes... Fazer o que? Esperar, né??? rsrsrsrs. Bjos e fique com Deus!!

    Cadica

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Cadica!!

      Que bom que gostou...espero que valha a pena esta espera...rsrsr...obrigado pela visita!

      Beijos

      Excluir
  9. já pode escrever as outras partes, tô curiosa! kkkk

    ResponderExcluir
  10. Puxa, Rafael! Você me prende com sua escrita! Parabéns!
    Gostei muito do conto, apesar de ter me deixado profundamente preocupada com a situação do pobre senhor - e curiosa para saber o que acontecerá com ele nas próximas duas partes...
    Abraço! Continue a surpreender-nos!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Larissa!! Muito obrigado!

      Que bom que você gostou, e não fiquei preocupada "as coisas podem piorar..." brincadeira!

      Amanhã vem a segunda parte...

      Abraço!

      Excluir
  11. Muitos parabéns por este início de um conto que suscita tanto interesse:
    Estou apta para acompanhar o evoluir desta sua criação literária.
    Uma saudação. Maria Beatriz

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Maria Beatriz!

      Fico contente que esteja gostando, espero conseguir manter a linha de desenvolvimento...

      Abraço,

      Rafael

      Excluir
  12. Fiquei tentando encontrar um nome e uma idade pra ele. Porque ninguém faça nada? Por que ele anda sempre tão sozinho? Me deixou curiosa, realmente curiosa e quando eu fico assim, haha. Parabéns, conseguiu despertar a minha imaginação. Quero mesmo saber quais os rumos dessa história e descobrir um pouco mais sobre esse tal sujeito.

    Abraços.

    www.eraoutravezamor.blogspot.com

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Mayra!!

      Que bacana, gostei de saber que tentou encontrar estas coisas...eu tbm costumo fazer isso, mas com texto de outras pessoas, que bom que no meu também funcionou. hahaha, que bom que ficou curiosa então, espero que valha a pena..rsrs

      Hoje, no fim do dia, sai a segunda parte...vai me contando!rsrs

      []s

      Excluir